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 Em 1991, Vladimir Putin deixava de ser um espião da KGB, o serviço secreto russo que chegara ao fim com o colapso da União Soviética, em dezembro daquele ano. A partir dali, a ascensão do ex-agente secreto foi rápida como um míssil hipersônico. No final daquela década, ele já figurava no primeiro escalão político do país, ostentando os poderes de primeiro-ministro durante o governo Boris Yeltsin.

Em dezembro de 1999, Yeltsin renunciou, e Putin assumiu como presidente interino. Um importante conflito em curso naquela época foi marcado pelo pulso firme do novo mandatário, característica que logo chamou a atenção da opinião pública, que enxergou naquela figura um líder disposto a recolocar sob as ordens de Moscou os rebeldes chechenos. A reedição da guerra da Chechênia foi uma ação interpretada por muitos como um ressurgimento do poderio do Estado russo.

De lá para cá, o chefe do Kremlin consolidou o poder e fortaleceu o papel da Rússia no cenário mundial, meta atingida à base de violência e autoritarismo. Isso inclui perseguição a opositores políticos, inclusive com suspeitas de envenenamento, censura e repressão à imprensa e a ativistas contrários ao regime e mortes, muitas mortes. Nessa conta entram a guerra devastadora na região do Cáucaso, ações fatais de suas forças especiais que resultaram em baixas civis, a queda suspeita de um avião comercial e, em 2022, uma invasão à Ucrânia que colocou o mundo em alerta.


A Referência organizou alguns dos principais incidentes nos quais o líder russo esteve envolvido diretamente ou é forte suspeito de participação, todos ocorridos nas mais de duas décadas desde que foi elevado ao posto de autocrata. São dezenas de milhares de pessoas que perderam a vida em função de ações associadas a Putin, um número que aumentará bastante ao longo da guerra que ele provocou na Ucrânia.


Segunda Guerra da Chechênia (1999)

A segunda guerra da Chechênia ocorreu entre 1999 e 2009. A capital, Grozny, que já havia sido arrasada pelo primeiro conflito, em 1994, tornou-se praticamente um buraco no mapa, sendo considerada a cidade mais destruída do planeta pela ONU (Organização das Nações Unidas). Quase nada ficou em pé.


A justificativa dada por Putin para a ofensiva foi um atentado a um prédio residencial no centro de Moscou, que terminou com a morte de dezenas de russos. O episódio é conhecido como o “11 de Setembro Russo”, e suspeita-se que tenha sido forjado para legitimar a incursão ao território checheno.

Foram relatados estupros, incêndios criminosos, tortura e outros crimes cometidos pelas forças russas. “É uma guerra ‘bespredel’” (sem limites, em tradução do russo). Não chegaremos a lugar nenhum na Chechênia”, disse um soldado russo de 21 anos ao jornal Los Angeles Times em 2000. “Temos que ser cruéis com eles. Caso contrário, não conseguiremos nada”.


Mortes de russos: 4.249

Militantes mortos: 16.299


Crise dos reféns do Teatro de Dubrovka (2002)

Em 23 de outubro de 2002, a Rússia e o mundo ficaram chocados quando as forças especiais do país cercaram um teatro onde 921 pessoas eram mantidas reféns por 40 insurgentes chechenos. Na ocasião, ocorria uma apresentação do popular musical Nord-Ost. O cerco terminou em tragédia.


Três dias depois do sequestro, os serviços de segurança russos injetaram o chamado gás do sono no Teatro Dubrovka, invadiram o local e mataram todos os agressores. Porém, 130 reféns morreram em decorrência dos efeitos do gás. Muitas perguntas permanecem sem resposta desde então e há o sentimento de que as vítimas não receberam justiça.


O médico chefe de saúde pública de Moscou, Andrey Seltsovskiy, e o próprio presidente Vladimir Putin insistiram que o gás não poderia ter causado a morte, mas seu nome e fórmula química permanecem em segredo.


As ações das autoridades durante a crise não foram investigadas. Ninguém foi responsabilizado pelas mortes de 119 pessoas no hospital após a conclusão da operação de libertação, ou pela incapacidade dos serviços de inteligência de impedir o ataque.


Putin, por um decreto que nunca foi publicado oficialmente, concedeu ao vice-diretor da FSB (Agência Federal de Segurança, da sigla em inglês), Vladimir Pronichev, que administrou a operação, o título de “Herói da Rússia”. Os esforços do deputado Sergey Yushenkov para realizar audiências parlamentares foram bloqueados pela maioria pró-Kremlin.


Mortes: de 130 a 274


Dissidentes russos (a partir de 2003)

A rede portuguesa TSF relacionou mais de 15 casos em que suspeitas recaíram sobre o Kremlin por mortes ou tentativas de assassinato de dissidentes russos. Saiba quais são os mais conhecidos (e quem sobreviveu):


Yuri Shchekochikhin (2003)


Yuri Shchekochikhin, jornalista e membro do parlamento russo, morreu em 3 de julho de 2003, vitimado por uma doença rara, apontaram especialistas. No entanto, parentes e colegas de Shchekochikhin acreditam que ele tenha sido envenenado como uma manobra para impedi-lo de descobrir a verdade sobre um caso de corrupção de alto nível envolvendo funcionários da FSB e do Ministério Público.


Entre a data da morte dele e 2008, colegas e amigos pediram incessantemente a abertura de um processo criminal para investigar as circunstâncias reais da morte. Mas a Justiça russa recusou-se duas vezes a fazê-lo, alegando não ter encontrado indícios de crime.


Anna Politkovskaya (2006)


Em 2006, a vítima foi a jornalista Anna Politkovskaya, de 48 anos. Ela foi encontrada morta com quatro tiros, um deles na cabeça, junto ao elevador do prédio onde morava. Politkovskaya vinha sendo ameaçada pelo trabalho investigativo que fazia na Chechênia, denunciando abusos de poder e também por suas críticas endereçadas a Putin, a quem acusava de transformar o país em um Estado policial.


Ela foi assassinada no dia de aniversário de Vladimir Putin e dois dias depois das comemorações do aniversário de Ramzan Kadyrov, líder checheno pró-Moscou. As coincidências levantaram suspeitas de que alguém teve a intenção de dar um “presente de aniversário” a ambos.


Alexander Litvinenko (2006)


Em 2006, tiveram início as mortes de dissidentes russos no estrangeiro. O primeiro foi Alexander Litvinenko, um membro da FSB que, em 1998, acusou seus superiores de terem ordenado a morte do oligarca Boris Berezovsky.


Depois de ter sido detido duas vezes na Rússia, ele fugiu para a Inglaterra, onde recebeu asilo. Durante o tempo em que viveu em Londres, Litvinenko escreveu dois livros, nos quais acusou os serviços secretos russos de terem encenado os atentados à bomba contra apartamentos em diversas cidades russas e outros atos terroristas, como as crises de reféns da escola de Beslan e do teatro de Dubrovka. Segundo ele, tudo foi feito para levar Putin ao poder e justificar a guerra na Chechênia. Ele também acusou o chefe de Estado de ter ordenado o assassinato de Politkovskaya.


Segundo análises médicas, Litvinenko foi envenenado com Polonium 210, que demorou 22 dias para matá-lo. Antes de morrer, ele teve tempo de garantir à policia que uma morte como a dele só podia ter sido ordenada por uma pessoa: Vladimir Putin.

Alexander Litvinenko foi enterrado no Cemitério Highgate, em Londres (Foto: Flickr)

Serguei Magnitsky (2006)


A morte seguinte foi a de Serguei Magnitsky, 37 anos, um advogado e auditor tributário de Moscou que trabalhava para a maior empresa de investimento estrangeiro no país quando se deparou com um caso de corrupção que envolvia um grupo de membros do Ministério do Interior. Divulgado o escândalo, Serguei Magnitsky foi o único envolvido nas investigações que não quis fugir.


Ele foi preso e espancado quase até à morte. Acabou por não resistir aos ferimentos depois de lhe ter sido negada assistência médica.


O chefe de Magnitsky, o investidor britânico Bill Browder, ficou horrorizado com o assassinato de seu funcionário. Sabendo que os responsáveis eram altos funcionários do regime e dificilmente seriam punidos, ele decidiu atacar outro ponto doloroso para Putin: conseguiu a aprovação em vários países da “Lei Magnitsky”, que prevê i congelamento de bens e a proibição de viagens ao estrangeiro de quem viole os direitos humanos.


Boris Berezovsky (2013)


Boris Berezovsky foi um oligarca russo que ajudou Putin a atingir o poder, mas que se desentendeu com o líder russo posteriormente e passou a ser crítico feroz do regime. Empresário e político, ele se beneficiou do período de liberalização econômica pós-soviético. Chegou a ser um dos homens mais ricos da Rússia, mas o mal-estar com o sucessor de Yeltsin o obrigou a fugir para a Inglaterra.


Beresovsky foi vítima de várias tentativas de assassinato, mas nunca se calou. Mesmo no exílio, continuou a atacar Putin e alguns dos parceiros do presidente, como Roman Abramovich, dono do Chelsea. Aos 67 anos, ele foi encontrado morto em sua casa no condado de Surrey, nos arredores de Londres.


Alexander Perepilichny (2012)


Alexander Perepilichny foi um empresário e denunciante russo que morreu enquanto praticava exercícios físicos em Londres em 2012. Ele havia deixado a Rússia em 2009 após brigar com um grupo de clientes poderosos.


Um cardiologista britânico nomeado pelo tribunal concluiu que a morte foi decorrente de causas naturais. No entanto, o inquérito sobre a morte continua, e perguntas e especulações se espalharam. A principal dúvida que recai é se ele teria sido envenenado por causa de seu status de denunciante, que ajudou a expor uma fraude de vários milhões de libras na Rússia.


No Reino Unido, Perepilichny denunciou o suposto crime organizado em Moscou e transmitiu detalhes às autoridades suíças. O inquérito descobriu que ele tinha sido “banqueiro privado” de Vladlen Stepanov, marido de uma alta funcionária do fisco de Moscou e supostamente envolvido na fraude.


Massacre de Beslan (2004)

No dia 1° de setembro de 2004, em Beslan, na Ossétia do Norte, uma manhã de escola que deveria ser normal para as crianças acabou virando um filme de horror.


Um grupo de 30 terroristas invadiu o educandário e fez 1,3 mil pessoas como reféns, entre famílias, professores e crianças entre 7 e 18 anos. Apenas 50 conseguiram escapar da escola no momento da invasão. Quem ficou foi submetido a três dias de inferno no ginásio da escola, sob ameaça constante de explosivos e em meio a um calor sufocante. Os terroristas se recusaram a dar água e comida aos detidos.


Sem sucesso nas tentativas de negociação, no dia 3 de setembro as autoridades coordenaram uma invasão à escola. Após duas horas de combate, o ginásio explodiu. Morreram 344 pessoas no interior do prédio, sendo 331 civis, 186 deles crianças.


Mortes: 334

Mãe no túmulo da filha no cemitério de Beslan (Foto: WikiCommons)
Guerra russa-georgiana (2008)
O conflito ocorrido em agosto de 2008 teve início quando as tropas georgianas tentaram recuperar, sem sucesso, o controle da província separatista da Ossétia do Sul, apoiada por Moscou. A Rússia enviou unidades que derrotaram os militares da Geórgia em cinco dias de combate.

A Geórgia acusou os russos de violarem a Convenção Europeia de Direitos Humanos durante e depois da guerra, mas o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos aceitou apenas as queixas relacionadas ao período posterior aos combates.

Tanque das forças georgianas destruído em combate (Foto: WikiCommons)
Mais tarde, o tribunal decidiu que a Rússia foi responsável por atos de tortura contra prisioneiros de guerra, detenções arbitrárias e “tratamento desumano e degradante” de 160 civis georgianos em agosto de 2008.

Mortos georgianos: 180
Mortos russos: 218
Civis mortos: 589

Insurgência no Cáucaso Norte (2009)
A insurgência no Norte do Cáucaso, também conhecida como Frente Cáucaso, foi uma continuação da violência política, étnica e religiosa naquela região, apesar do fim oficial das operações armadas na Chechênia em 15 de abril de 2009.

A violência se concentrou principalmente nas repúblicas do Cáucaso Norte da Chechênia, Dagestan, Inguchétia e Kabardie-Balkaria, incluindo confrontos e ataques ocasionais em outros lugares (como Moscou e Ossétia do Norte). Também trouxe preocupações com a segurança dos Jogos Olímpicos de Inverno Sochi 2014.

Mortos russos: 1.189
Insurgentes mortos: 2.247

Voo MH17 (2014)
Foram 298 pessoas que perderam a vida após embarcarem no voo MH17, da Malaysian Airlines, que caiu em 2014 enquanto sobrevoava a Ucrânia. De acordo com investigadores internacionais que analisaram o caso, o Boeing 777, que viajava de Amsterdã para Kuala Lumpur, foi abatido por um míssil russo disparado.



Memorial no Aeroporto de Amsterdã para as vítimas do vôo MH17 (Foto: Wikimedia Commons)
Mortos: 298

Boris Nemtsov (2015)
Por um longo período, Boris Nemtsov foi membro das principais forças do partido União das Forças de Direita. Após a primeira eleição do presidente Vladimir Putin, em 2000, ele se tornou um dos maiores críticos do chefe do Kremlin.

Nemtsov denunciou a ineficiência e a corrupção e expressou fortes críticas da política russa na Ucrânia. Ele foi morto poucas horas após conceder uma entrevista em que disparou inúmeras acusações ao governo. Ele também trabalhou em um relatório sobre a participação da Rússia no conflito na Ucrânia.

Mikhail Yuryevich Lesin (2015)
Foi um político russo, executivo de mídia e conselheiro de Putin. Em 2006, ele foi condecorado com a Ordem “Por Mérito à Pátria”, uma das mais altas condecorações estatais da Rússia para civis. Lesin foi apelidado de Bulldozer (escavadeira) devido à capacidade de colocar praticamente todos os meios de comunicação russos sob o controle do Kremlin e por ser um personagem combativo.

Lesin morreu em um Washington, nos EUA, em circunstâncias incomuns. Sua família inicialmente disse que a causa da morte foi um ataque cardíaco. Mas, após uma investigação de um ano, o legista-chefe de Washington e as autoridades federais divulgaram um comunicado conjunto dizendo que Lesin morreu de traumatismo contundente na cabeça, induzido por quedas em meio à intoxicação aguda por etanol.

Um relatório vazado posteriormente ao FBI afirma que Lesin foi espancado até a morte por homens que trabalhavam para um oligarca próximo a Putin.

Sobreviventes a tentativas de assassinatos
Alexey Navalny

Em agosto de 2020, durante viagem à Sibéria, o principal opositor político de Putin, Alexey Navalny, foi envenenado e passou meses se recuperando em Berlim. Ele voltou a Moscou em 17 de janeiro de 2021 e foi detido ainda no aeroporto. Um mês depois, foi julgado e condenado a dois anos e meio de prisão por violar uma sentença suspensa de 2014, sob acusação de fraude. Promotores alegaram que ele não se apresentou regularmente à polícia em 2020, justamente quando estava em coma pela dose tóxica.
Alexei Navalny, oposicionista do presidente Vladimir Putin (Foto: reprodução/Instagram)
Sergei Skripal

Dois supostos agentes russos foram acusados de atacar o ex-oficial de inteligência do Kremlin Sergei Skripal, em 2018. Os mesmos homens teriam tentado envenenar Skripal e sua filha, Yulia, em Salisbury, no Reino Unido, com uma dose tóxica de novichok. O agente nervoso, também usado contra Navalny, era comum na perseguição a inimigos da era soviética. A Rússia nega qualquer envolvimento no ataque.

Viktor Yushchenko

Em 26 de dezembro de 2004, o líder da Revolução Laranja, o opositor pró-Ocidente Viktor Yushchenko, sofreu um misterioso envenenamento durante a campanha. Ele foi o responsável por abrir uma nova era política no país, pondo fim aos dez anos de Presidência de Leonid Kuchma na Ucrânia, que pendulava entre União Europeia (UE) e Moscou. Yushchenko reiterou a vontade da Ucrânia de aderir à UE, apesar das objeções de Bruxelas e da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte).

Invasão à Ucrânia (2022)
Segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), foram confirmadas as mortes de 406 civis ucranianos, mas é provável que o número real seja muito maior. Em Mariupol, por exemplo, uma das cidades mais afetadas, o vice-prefeito Serhiy Orlov diz que mais de 1,2 mil corpos foram recolhidos das ruas e começaram a ser enterrados em valas comuns. O governo da Ucrânia alegou no domingo que 11 mil soldados russos haviam sido mortos até então desde o início da invasão em 24 de fevereiro.
Uma mulher olha para sua casa danificada após um bombardeio em Mariupol, no sudeste da Ucrânia (Foto: UNICEF/Evgeniy Maloletka)




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