Iniciativas nos abrigos da Operação Acolhida em Roraima ajudam pessoas que chegam em situação ainda mais vulnerável ao país depois de fugirem de perseguição e de violações dos direitos humanos.
Mais de 7 mil pessoas, a maioria venezuelanos que cruzaram a pé a fronteira, aguardam nos abrigos da Operação Acolhida em Roraima a chance de seguir viagem para outro estado do Brasil e ir adiante com uma nova vida.
Migrantes que deixam a Venezuela para pedir refúgio no Brasil são, por si só, vulneráveis. Mas mulheres em situação de vulnerabilidade extrema recebem diferentes formas de ajuda — que vão de oficinas de capacitação ao envio preferencial a outro abrigo em outra parte do Brasil — para escapar da perseguição e das condições precárias em que viviam no país de origem.
Perla Sofía Hernández, de 21 anos, por exemplo, escapou da transfobia na Venezuela. O Brasil, país de destino, ainda é bastante problemático quando se trata de violência contra pessoas trans. No entanto, só de ter o nome social — Perla — na documentação, a jovem fã de design gráfico e animes se sente bastante aliviada.
“[A discriminação] é uma coisa horrível na Venezuela. Imagina: te maltratam, te atacam verbalmente. Às vezes até atacam fisicamente, tem gente que quer bater”, relata Perla.
Agora no Brasil, a jovem percebe que outros venezuelanos que fizeram o mesmo trajeto têm aprendido a conviver com a diferença. E isso a torna mais forte para seguir adiante no sonho de morar em São Paulo e se tornar uma desenhista.
“Uma coisa que me agrada bastante é ver como o caminho de um país a outro pode mudar a personalidade da pessoa, a maneira de pensar. É uma coisa que me emociona muito, porque imagino que vou conhecer mais venezuelanos que não têm esse tipo de preconceito.”
Uma nova casa para as mães venezuelanas
Mulheres que chefiam famílias numerosas também recebem atenção especial nos abrigos da Operação Acolhida. A elas, uma alternativa é pleitear a interiorização institucional — ou seja, quando o migrante solicitante de refúgio consegue ir a uma instituição parceira da agência da ONU para refugiados (Acnur) em outro estado com apoio do governo brasileiro.
A espera pode ser longa, mas, quando a convocação sai, os venezuelanos festejam muito. Choros e gritos de felicidade são ouvidos de longe. Infelizmente, quem não é chamado naquele momento lamenta ter que aguardar mais um tempo dentro dos abrigos em Roraima.
No dia em que o g1 visitou uma das unidades da Operação Acolhida em Boa Vista, Juleima Díaz, de 47 anos, recebia a notícia de que ela, os filhos, os genros e os netos — um total de 15 pessoas — foram selecionados para se mudarem para o Rio de Janeiro depois de um ano de espera. Lá, viverão temporariamente em um outro abrigo com ajuda de organizações. Será a primeira vez que todos eles viajarão de avião.
“Depois de um ano, saiu o que eu tanto queria. E eu vim de longe para buscar uma nova qualidade de vida para meus filhos, um bom estudo”, conta Juleima.
De abril de 2018, estreia da Operação Acolhida, até novembro de 2021, um total de 64.478 venezuelanos foram deslocados de Roraima para outros estados brasileiros. Só neste ano, foram quase 18 mil. O estado que mais recebeu migrantes foi o Paraná: 10.602 no total. Ao todo, 778 municípios abrigam ou abrigaram beneficiários da força tarefa.
Uma possibilidade de interiorização para os venezuelanos solicitantes de refúgio é a conquista de um emprego em outra cidade. Dentro dos postos de triagem da Operação Acolhida, há inclusive recrutadores que se voluntariam a entrevistar migrantes — que podem sair de lá já com um emprego.
Mas como colocar mães que precisam cuidar de tantos filhos dentro dos abrigos em uma situação de igualdade com outras pessoas que disputam vagas no mercado de trabalho? É aí que entram iniciativas como o Empoderando Refugiadas, que oferece oficinas às mulheres abrigadas.
Foi com os cursos de capacitação desse projeto que Lisviannys Verasmendy e Catherine Acevedo, ambas com 30 anos, conseguiram uma vaga em uma empresa de alimentos em Curitiba. As duas estão de mudança programada para o Paraná com os respectivos maridos e filhos.
“Fiquei em choque. Quando me contaram, não conseguia nem falar. Uma amiga me disse: ‘Amiga, reage, você tem um emprego’. E eu fiquei paralisada, e ela: ‘Amiga, é para você”, relembra Catherine.
“Lutei muito para chegar aqui no Brasil, e aqui vou dar uma nova vida para mim, meus filhos e minha família na Venezuela. Foi um processo muito duro, mas, graças a Deus, já estamos aqui e vamos seguir adiante”, diz Lisviannys, que sonha em abrir um restaurante.
Por que elas estão aqui?
Para que um migrante obtenha a condição de refúgio, é preciso solicitar a condição à Polícia Federal, que encaminha cada caso para análise no Comitê Nacional para os Refugiados (Conare).
Esses casos são analisados conforme a legislação brasileira, que considera elegível para a obtenção do status de refugiado quando há fundado temor de perseguição por:
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